terça-feira, 24 de janeiro de 2012



Sobre o aumento de passagens no Recife o pedido de 17,2%  tinha um objetivo: conformar a população com o aumento de 6,5% que seria realmente aprovado.  Talvez tivesse funcionado em outros tempos, quando a comunicação era um pouco menos facilitada e, sobretudo, quando a articulação política estava menos em voga entre os jovens de todo o mundo.
Tenho assistido o que posso daqui, da frente do computador, nas mídias, nos blogs e nos depoimentos que os amigos compartilham incansavelmente no facebook.
Algumas coisas me assustaram e me fizeram ter certeza de que realmente vivemos um verdadeiro faz de conta. Faz de conta que somos livres, faz de conta que temos o direito a expressão...
Primeiro: Porque estudantes ou articuladores dos protestos foram intimados pela polícia antes mesmo do ato? Nossos passos e nossas publicações estão sendo vigiadas por que tipo de “olho repressor”?
Segundo: Porque o uso da violência desde o primeiro instante. Porque chamar o batalhão de choque antes mesmo do movimento ganhar algum corpo. A ordem é dispersar? Então não podemos nos reunir e expressar a opinião se estivermos em massa?
Terceiro: A agressão da polícia aos estudantes que estavam “refugiados” na Faculdade de Direito do Recife já é por si só absurda. Mas o silêncio da Universidade chega a ser vergonhoso. Até o momento nem mesmo uma nota, daquelas que não dizem nada e que estamos acostumados a ver por ai, foi publicada. O silêncio também me assusta por parte do governo do Estado. E ausência do Reitor, em férias, e do governador, viajando, não justifica. Cadê suas assessorias de comunicação?
(Foto: André Nery)
A imagem chocante do dia é a gravata dada por um policial em umA manifestante. Que merda é essa? É impossível não recorrer ao conhecido verso da Legião Urbana: “Que país é esse?”.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

O dia que tapacurá estourou

Não existiu nada igual na historia da cidade. Nem em filme, conversa de mesa de bar, lembrança perdida da infância, anuncio publicitário ou qualquer escambal que fosse. Era novo. Um murro de Deus aplicado bem no meio da cara para lembrar que não éramos nada. Uma colônia de bactérias sobrevivente de um espirro divino. Nada mais faz sentido depois daquele dia.
Um dia de Recife com chuva. É quando os guarda-chuvas saem de casa para flertar entre si, com seus donos de caras remelentas e inchadas de sono segurando os cabos para não se molhar. Eles Inteiros, coloridos, quebrados, compridos, curtos e ocupam todas as calçadas que ainda não encharcaram. Cruzando o espaço entre as poças, esbarrando um no outro nessa dança desconexa. Dizendo “Oi fulana” entre os pingos frios.
Quem podia usava casaco, suéter ou qualquer buginganga de frio que todo mundo vê na televisão e fica morrendo de vontade de usar igual. Só que o Recife e seus vinte e nove célsius, em média, não deixam. Então dia de chuva vira uma chance de mostrar que você não é um pé-rapado. “Os Mendigos nos países frios tem mais estilo do que os nossos que mal usam um calção sem cueca, que dirá uma camisa”, diriam certos recifences. E nesse dia de chuva, papelão era disputado à tapa. #Quandoequetapacuravaiestourar já era vista no top trends do twiter.
Logo às oito da manhã, as ruas já se encontravam intransitáveis, berrava um Geraldo Freire ao vivo pela Super Manhã. Chuva era a pauta do dia. Na televisão o assunto era a mesma cantilena de todos os anos. Chuva. Agamenon? Parada. Muita chuva. Domingos Ferreira, mesma coisa. Chuva. Caxanga? Já nem se tinha mais esperança de chegar na hora. Chuva e chuva. Jardim Brasil e Peixinhos perderam a visibilidade do asfalto uma hora depois da chuva. Cadê o governo que não vê a situação da gente? Chovia torrencialmente em toda a região metropolitana do Recife.
De tarde a coisa complica mais. Escolas já liberavam os alunos desde as dez da manhã. Há todo momento o um nove zero estava a mil. Ligações de barreiras caindo. “Tapacurá vai estourar?” é o que dizem, mas ninguém acredita nesse boato. As ruas estão intransitáveis. Não há espaço para mais carros. As pessoas sabem disso e não ligam. Insistem em chegar as suas casas. Qualquer lugar menos aquele inferno molhado. O Governador anuncia que não é motivo de pânico, mas que os cidadãos da região metropolitana do Recife, caso possam, dirijam-se a locais mais altos.
Ouviu-se então um barulho distinto dos outros em meio à chuva. Um som surdo crescendo, tomando intensidade, pegando forma e deixando as pessoas dentro dos carros e nas ruas paralisadas. Elas olhavam entre si sem entender o que era. Aquilo vinha vindo, vindo, mais alto que o som das buzinas, da chuva batendo a mil nos telhados, dos motores, dos queixumes dentro do ônibus e de toda tragédia humana que vive no Recife e luta para sobreviver. Então veio a onda que estava atrasada há mais de vinte anos.
Pressão demais e uma rachadura que ninguém viu na parte interna da represa, tanta água de uma vez e a incapacidade de imaginar um absurdo selaram o destino de uma geração. Pelo menos foi o que disseram. As dezesseis e trinta uma onda gigantesca saiu de Camaragibe em direção ao centro destruindo tudo que podia no caminho. Matou os amantes nos motéis, abençoou os anseios dos pretensos suicidas do CFCH e dos que se ajoelhavam em sua frente aceitando a iminência da morte. Estuprou a Caxangá com sua fúria e silenciou todos os sonhos de quem ainda acreditava em Deus. As pessoas corriam em vão. Eram arremessadas umas sobre as outras, colidiam com carros e paredes. Quebravam os ossos e as juntas enquanto sufocavam com o lixo depositado nas vielas. Árvores centenárias que viram a cidade crescer foram arrancadas do solo, tombando sobre os fios de alta tensão causando mais dor e morte instantânea. Chegou ao centro em pouco mais de 10 minutos. Se tudo ocorreu em menos de meia hora, foi muito. Quase não deu tempo de dizer que era pra fugir, que amava, era pra se cuidar, que não ia dar mais para fazer aquela viagem ou ver quem ganhará “Dança dos famosos” desse ano. Só sobrou desolação.
Ninguém sabe onde está o governo. Está tudo destruído. As pessoas que moram nos morros sobreviveram até onde a doença e a fome deixaram. Helicópteros tiraram quem pode pagar. Alguns anos depois, disseram que aquela história de cheia era um boato. Vai saber...

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Ônibus Blindado para transporte dos Sulanqueiros

(essa matéria é meramente ficcional. todos os peronagens, lugares e ideias e situações foram utilizados apenas como elementos literários)

Cansados dos constantes assaltos a ônibus de comerciantes populares (os chamados sulanqueiros), a empresa SIMBORA inaugura a sua primeira linha de blindados. Inspirados nos veículos do BOPE, os coletivos são recobertos de titânio, possuem duas metralhadoras na parte superior, lagartas de tanque de guerra e outros apetrechos secretos caso aja necessidade de passar por cima de outros veículos.
Se isso não bastar para intimidar os criminosos, os motoristas foram capacitados pelo exército para atuarem em locais de risco, tais como zonas de guerra ou tomadas ameaças hostis do mesmo nível. Ele é assessorado por mais dois funcionários que andam armados com fuzis de alto impacto e também receberam treinamento de sobrevivência no deserto e tortura para obtenção de informações que possam ser úteis para a policia na possibilidade de haver algum sobrevivente.
A iniciativa surgiu com Agenor Antero, motorista que já teve uma arma enfiada na boca que já teve de dançar a música do “todo enfiado” com uma tanga de uma passageira para divertimento dos bandidos. “Depois daquilo eu fui demitido porque não consegui chegar no horário na rodoviária. Peguei minha indenização e fiquei sem saber o que fazer da vida. Trabalho levando o povo pra sulanca há mais de trinta anos. Um dia eu estava em casa. Meu menino estava vendo aquele filme do capitão Nascimento quando eu vi o carro que eles usavam. Pensei assim ‘Agenor, dá pra tu fazer um igual, homi!’ Me ajuntei mais um sobrinho meu que é funileiro, falei com gerente, expliquei a situação. Ele riu quando eu falei a história da dança, mas liberou o dinheiro. Hoje vivo muito bem, graças a Deus”.
Os usuários passaram a utilizar do transporte (trinta por cento mais caro que o convencional) afirmam que o investimento vale a pena. “Estou muito contente com o serviço”, afirmou dona Maroneide de Jesus, sulanqueira há mais de vinte anos, que já nem lembra quantas vezes foi assaltada. “Era uma coisa certa, a gente saia de noite para fugir da fiscalização e aqueles filhos de uma cachorra sem pai vinham roubar a gente”. Os casos de abuso eram outra parte dolorosa do passado desordeiro. “Paravam o ônibus, subiam todos aqueles homens armados de tudo quanto é tipo de coisa. Aqueles homens grandes, fortes, das mãos enormes e de calça jeans cavada. Batiam na gente se a gente olhasse pra eles. Ficavam amolengano as meninas. Me amolegavam também, eu gostava, não vou mentir. Mas aí eles roubavam tudo. Só deixavam o que não valia muito. E eu ficava lá, toda molhada e sem um puto no bolso pra comprar um cigarro paraguaio que fosse. Hoje o tempo é outro, meu filho! Vendo toda a mercadoria. O que sobra de lucro eu gasto sempre com um cafuçu da voz grossa e barba, que tem a idade do meu neto, já que o traste do meu marido vive entupindo o cu de cana e dorme feito a desgraça”.
A empresa está fazendo a linha Caruaru-Recife a menos três meses. A expectativa é criar mais duas linhas até o fim do ano que vem que cortem o sertão, passando pelo polígono da maconha. Já se encontra em negociação linhas viárias que sirvam alguns dos principais trajetos das cidades do Rio de Janeiro e São Paulo.

domingo, 14 de novembro de 2010

Quando vai ser????

Como faço todo fim de semana, caminhei por um dia de novembro de sol a pino. A casa verde da minha mãe estava ao longe e no fim das minhas forças. Um oásis no meio do deserto. Meu cão estava na entrada, me olhou, veio até a minha direção. Não havia mais ninguem em casa. Entrei no lar vazio e assombrado pelas rizadas e tristesas de quem vive em uma familia. O cão sempre sempre ao meu lado. Em dado momento olhei no fundo dos seus olhos. Dotado da mesma certeza que um garoto tem ao olhar bem no fundo dos olhos do seu cão e da garota ao olhar no mais fundo da pupila de seu bichano, que vai embora alguem. e quando soube disso eu pensei que fosse ele, meu pai, minha mãe, minha avó, meu irmão, meus amigos, meus amores todos por quem sou apaixonado.
Uma certeza maior pór saber que hoje estou mais perto da morte. não consigo imaginar o ano que vem sem saber da morte de alguem que conheço. é fato tão preciso quanto as separações dos famosos, os novos rits da musica descartável brasileira e todas as demais coisas que vemos nas retrospectivas de fim de ano.
Não dá para ficar inerte sem se sentir mal. ver o mundo como você conhece chegando ao fim.Aqueles seres tão presentes e constantes na nossa vida como o respirar, o ter fome, amar, apaixonar, sorrir, gritar derrepente, se acabar.
Minhas lágrimas eram tão pesadas que me levaram ao chão. Faltou-me justo o ar daquela lufada de vento que nos deixa em pé. Enquanto eu o abraçava tolamente meu amigo me lambia tentando encontrar o sentido de tanta dor.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

fatalismo

Largou do trabalho e ligou para ela. Vou passar aí. Não sei, ela respondeu, tenho trabalho para fazer, uns projetos para entregar, meu marido pode aparecer... Vai ser rápido, argumentou. Em quinze minutos estava tocando a campainha dela. Sorriram sem tomados pela fatalidade dos eventos que aconteciam. Cinco minutos após já faziam amor de fim do mundo. Quando terminaram, se vestiu, a beijou na boca e foi embora. Não falaram muito além do habitual. Tomou o caminho para seu lar. Quando chegou recebeu a uma mensagem dela pedido para tirar uma duvida. Oi, aconteceu alguma coisa?! Você está sozinho? Estou. Não tem ninguém com você? Não, por quê? Nem amigos nem outra pessoa? Não tem ninguém aqui, certificou-a. Não quero mais ver você, ela disse, nunca mais. Me esqueça. Aquilo tinha lhe pego de jeito. Você tem certeza? Perguntou. Absoluta, respondeu. Ficaram o resto da ligação em silencio. Ela encerrou a ligação de súbito. Sobrou naquele lugar vazio o homem, com o silencio da solidão e a amargura das escolhas que fez na vida.

sábado, 23 de outubro de 2010

Manifesto do Casa do Macho da Boa Vista

Será o Benedito? Não, nem ele suportaria o mundo moderno. Esse antro em que se precisa ser sensível, suave, gentil. Falar alto é grosso, palavrão então se tornou pecado mortal. Graças a essas mulheres pós-revolução sexual, com seus sutiãs queimados, anticoncepcionais cada vez mais criativos, nós homens fomos obrigados a nos comportar e baixar a tampa da privada abaixada e se servir sozinho. Estamos sendo domesticados, cavalheiros!
Mas e os estádios de futebol, os barzinhos pé-de-esquina e demais antros historicamente dominados pelos varões descendentes de Adão? Não estão aí para suprir essa ausência de espaço com suor e palavrões que nos caracterizam feito homens? Mas noticias. Foram sutilmente tomados por essas mulheres que descobriram como se infiltrar em nossos paraísos secretos.
Inconscientemente acabamos fazendo o mesmo. A ausência de um ambiente onde a testosterona flua normalmente nos deixa abalados como machos. Inverte papeis historicamente definidos. A metrosexualidade é prova cabal do quanto ambos perdemos nesse espaço, companheiros. Se não for tomada uma iniciativa contundente para reverter esse mal teremos um mundo suave e tenebroso. Vejo mulheres sentadas na sala e lendo o jornal, já que você está terminando de arrumar o cabelo e passando creme anti-rugas. Quando você menos esperar já vai estar se depilando todo e com medo de barata.
Você precisa tomar jeito na vida! Ou então sua princesa vai se frustrar quando precisar ser puxada pelos cabelos, jogada na parede e virar a lagartixa mais feliz da paróquia e você não corresponder às expectativas dela, pois ficou com medo de machucá-la (ou quebrar a unha). Quero só ver a tua cara quando ela falar na hora do amor ouvir “bate feito homem, porra!”
Faz-se mister a produção de um espaço em que a cafuzisse seja preservada. O lar do Macho vem para cumprir esse papel importante. Um espaço onde se manda quem quiser para a puta que o pariu, cultivar o calo sexual sem culpa, bater forte sem perder a amizade, falar na altura que lhe convém, fumar até o pulmão não ter mais força de puxar nada, beber todo álcool e comer o mais oleoso e gordurento tira-gosto feito um porco. Tudo isso servido por menininhas com peitinhos de fora que adoram receber uma tapinha na bunda para te lembrar com orgulho o motivo de você poder mijar em pé.
Se você se sentiu sensibilizado a causa, junte-se a nós. Aceitamos doações de maços de cigarros, garrafas de uísque e estamos cadastrando as meninas voluntárias que sentem necessidade de fazer feliz esse ultimo exemplo de virilidade, que somos nós.
Quem está comigo?

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Tempoeira

Todo dia eu acordo mais cedo
Para conseguir chegar mais rápido onde sou cobrado,
fazer a tempo tudo o que preciso para ficar livre das minhas obrigações
aquelas coisas todas onde me meti.
Finalmente ser deixado em paz
Ter o tempo livre que desejo e deixei de usar no instante que acordei mais cedo.
Mas a cada momento que fico mais livre crio outros grilhões
Que me deixam preso a novos trabalhos
E acordo mais cedo ainda
Para lidar com essas novas condições
E encontrar tempo de descansar, viver.
Mas o tempo passa em outra velocidade
Surgem novas variáveis que não estavam previstas
(Ônibus
Trânsito
Esqueci!
Não veio?
Não ficou pronto a tempo...)
E eu resolvo cortar justo onde dói mais
Todo dia é o mesmo dia
Porque eu ainda não fui dormir.